“Tou bem com a tropa”
Felizmente ainda não é possível ler mentes. Mas, passados alguns dias desde a fatídica manhã do dia 6 de fevereiro, é dessa forma que perpassa a relativa ignorância o pensamento do governador Rui Costa ao comentar a morte de 12 pessoas numa ação policial no bairro do Cabula, em Salvador. “Tou bem com a tropa”.
Não cabe aqui analisar quem estava certo: quem atirou ou quem morreu. Porém, ao ver a forma como policiais militares e a população em geral reagiram ao ouvir do governador a esdrúxula comparação entre aquele que aperta o gatilho e um artilheiro, prestes a marcar um gol, é preciso retroceder. Voltar a um passado recente, cujas feridas não cicatrizaram, mas doem menos.
Em fevereiro de 2012, ano eleitoral, a Polícia Militar parou. Liderados pelo hoje deputado Marcos Prisco, os PMs entraram em greve. Naqueles dias de terror, a população – negra e pobre, em sua maioria – assistiu a barbárie de um Estado sem lei (No country for old men). Foi quando ficou evidente que o chefe de Estado da época, Jaques Wagner, não mais detinha a influência necessária sobre uma corporação militarizada e responsável (thanks, God) por manter a “ordem” na terra de Todos os Santos – que provavelmente tiraram férias.
Já não é necessário escrever do que resultou a paralisação de 2012: Soldado Prisco, como se apresenta politicamente, foi alçado vereador da maior cidade baiana. Dois anos depois, também em ano eleitoral, novo movimento paradista. Menos sangrento, agradecemos. Entretanto, reforçou que o governo da Bahia exercia pouca ou nenhuma influência sobre a tropa. (Mais uma vez, Prisco acabou eleito, mas não é essa a questão)
Eis que, finado o governo de Wagner e com claras sinalizações de que a centenária e briosa Polícia Militar da Bahia não era tão amistosa com o morador do Palácio de Ondina, o discurso de Rui soou como que um canto da sereia para os pouco satisfeitos da PM. Eram agora, os policiais, artilheiros próximos do almejado gol. E tudo de ruim na relação entre a tropa e o governo ficou no passado.
O mérito de culpados e inocentes nas morte daquela sexta sangrenta, como foram aqueles dias do pré-Carnaval de 2012, quem deve julgar são os tribunais cabíveis. No entanto, para quem ouviu o discurso do novo governador e lembra da recente tensão entre o governo e policiais, não há como não crer no efeito colateral do tento dos PMs: “Tou bem com a tropa”.