Voto aberto na Câmara de Salvador volta a ganhar corpo
Nem peso na consciência, nem pressão da imprensa. Para vereadores soteropolitanos que preferem o anonimato, a defesa em massa do voto aberto para apreciação de contas do prefeito e vetos do Executivo são uma tentativa de angariar capital político a partir de uma matéria com grande repercussão popular. Outros, porém, discordam. O rastro para o início da discussão veio de uma emenda apresentada pelo presidente do legislativo, Paulo Câmara (PSDB), logo após a eleição da mesa diretora, pedindo a supressão do inciso que obriga a votação secreta para deliberar sobre projetos vetados e contas do prefeito. “Logo após a eleição, eu levantei a bandeira do voto aberto. Se a Câmara conseguir esse ato de entendimento com a sociedade, teremos um grande avanço. É mais transparência para a Câmara e para a população”, avaliou o tucano.
Uma tentativa de pressão aconteceu logo após 21 vereadores anunciarem ter votado contra as contas do exercício 2010 do ex-prefeito João Henrique e apenas 18 deles terem efetivamente depositado esse voto na urna, o constrangimento público com o erro de cálculo ficou maior que o esperado. “Ninguém falava disso antes da votação das contas de João. A imagem da Câmara e dos vereadores ficou desgastada, querem correr atrás do prejuízo”, avaliou um dos caciques da Casa. Agora, com a aprovação de projetos de forte apelo popular em outros elementos, a discussão sobre o voto aberto urge na pauta dos edis da capital baiana.
Empenhada para que haja voto aberto no legislativo, a vereadora Fabíola Mansur (PSB) lançou há mais de dois meses uma mobilização para o fim segredo sobre as ações dos colegas. Segundo ela, o voto aberto estimula a transparência da Câmara, que é o “que o cidadão quer”. “Queremos agilizar o voto aberto. É muito importante que a gente comece logo a praticá-lo aprovando em caráter de urgência-urgentíssima a emenda de Lei Orgânica do Município (LOM) apresentada pelo vereador Paulo Câmara”, defendeu Fabíola, sem furtar a iniciativa do tucano. A campanha, todavia, arrefeceu e não entrou na pauta do legislativo ainda. Ela, entretanto, deseja que o projeto seja votado antes que as contas de 2011 do ex-prefeito João Henrique cheguem ao plenário. “É importante que já possamos ter o voto aberto na votação deste parecer do TCM, que recomenda, igualmente, a rejeição das finanças”, frisou. Com as manifestações populares, o tema voltou a ganhar repercussão e exemplos de peso, como a aprovação de um projeto similar na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara Federal.
Tema une governo e oposição
A matéria parece ter adesão dos vereadores independentemente da posição política adotada por eles. Tanto que Fabíola Mansur (PSB) adota postura semelhante a defendida pelo tucano Paulo Câmara e também pelo democrata Léo Prates. Vice-líder do governo no legislativo, Prates sugere que a transparência deve pautar as ações dos vereadores, assegurando ter seu mandato baseado nesse princípio. “Esse projeto do vereador Paulo Câmara foi apresentado com a minha assinatura. Eu acredito que esse é um dos que poderá dar uma resposta ao clamor das ruas, por mais transparência na vida pública”, aponta o democrata.
A partir da fala do líder da oposição, Gilmar Santiago (PT), percebe-se que o voto aberto une extremos na Câmara de Salvador. Como os demais vereadores consultados, o petista estima que o fim do voto secreto para a apreciação de contas do prefeito e vetos do Executivo amplia a transparência dos mandatários com os eleitores. Ele, porém, pondera um pouco. “Reconheço que, em algumas situações, o voto secreto beneficia uma minoria que, fazendo parte da maioria, acaba não seguindo a recomendação da bancada”, pontua.
A matéria, no entanto, não deve ter uma aprovação sem debates. Segundo informações de bastidores, um grupo significativo de vereadores articula um posicionamento diametralmente oposto à votação aberta dos assuntos, conforme proposição do presidente da Câmara.
Projeto está longe de ser unanimidade entre vereadores
A forma com que vem sendo conduzido o debate sobre o final do voto secreto na Câmara de Salvador causa discordância entre os vereadores e preocupa defensores da emenda proposta pelo vereador Paulo Câmara (PSDB). Apontado como um dos articuladores do projeto junto à oposição, Gilmar Santiago (PT) sugere que colegas de legislativo interpretaram como agressiva a campanha “Sou honesto, voto aberto”, lançada por sites de notícias da capital baiana em abril. Para ele, “quem vota secreto não é necessariamente desonesto”. “Está acontecendo uma campanha como se fosse externa, mas a Câmara já estava discutindo o tema há algum tempo”, sugere o petista. Segundo Santiago, “majoritariamente, os vereadores são a favor do voto aberto, mas alguns questionam a forma como o debate está sendo conduzido”. Apesar de falar em nome da oposição enquanto líder, ele admite a necessidade de ouvir os pares antes.
No caso do líder do governo, Joceval Rodrigues (PPS), a preocupação com a emenda a Lei Orgânica do Município traz uma discussão ainda mais ampla. “Quanto mais transparência melhor. Mas tem aqueles que são contra mais mudanças na Lei Orgânica do Município. Por isso alguns vereadores defendem a reforma dela e do regimento interno o quanto antes”, indica.
Em defesa do voto secreto, poucos vereadores se manife O rastro para o início da discussão veio de uma emenda apresentada pelo presidente do legislativo, Paulo Câmara (PSDB), logo após a eleição da mesa diretora, pedindo a supressão do inciso que obriga a votação secreta para deliberar sobre projetos vetados e contas do prefeito. “Logo após a eleição, eu levantei a bandeira do voto aberto. Se a Câmara conseguir esse ato de entendimento com a sociedade, teremos um grande avanço. É mais transparência para a Câmara e para a população”, avaliou o tucano.
stam publicamente. Entre eles, Carlos Muniz (PTN), ancorado na defesa da integridade da Câmara. “O voto secreto em relação as contas do prefeito existe para proteger o Legislativo do Executivo, que pode perseguir o vereador que votou contra as contas, por exemplo”, sugere. Ele cita ainda que os vereadores Alan Castro (PTN) e David Rios (PSD) também apresentam posturas semelhantes – procurados, ambos não foram localizados para confirmar. “Se for para ser voto aberto, que seja tudo aberto. Só tirar as contas do voto secreto beneficia apenas o Executivo”, avalia Muniz.
Para aprovar a urgência-urgentíssima e a emenda, é necessária maioria qualificada (29 votos), o que, segundo as contas de alguns líderes políticos, deve atrasar a apreciação do projeto. “Apesar da maioria das lideranças defenderem o voto aberto, o chamado baixo clero está organizado e é contra. Acredito que o projeto só deve ser votado quando houver consenso”, aponta, reservadamente, um dos defensores do projeto. “E, provavelmente, não vai ser uma matéria aprovada com facilidade. Principalmente por causa das contas do ex-prefeito João Henrique de 2011, que aguardam por votação”, completa a fonte.
*Publicada originalmente na Tribuna da Bahia de 05 de julho de 2013