Política, a arte controvertida de justificar
“Eu conheço a Cláudia Oliveira de muitos anos. Ela é uma esposa dedicada, foi primeira-dama de Eunápolis esse período todo, contra ela nunca se colocaram uma mácula, nada que pudesse deslustrar a imagem dela. Uma pessoa decente, uma mãe dedicada a sua filha, uma filha dedicada a sua mãe, a seus pais.”
A fala foi do vice-governador da Bahia e presidente estadual do PSD, Otto Alencar, durante uma entrevista à rádio Tudo FM. Questionado sobre o caso da deputada estadual e candidata a prefeita de Porto Seguro, Cláudia Oliveira, filiada à legenda que Alencar preside, flagrada numa brincadeira gravada em que sugere a construção de uma ponte de R$ 2 bilhões, desviando R$ 1 bilhão para si. Como a própria parlamentar alegou, num primeiro momento, que houve montagem no vídeo, segue para conclusões dos leitores:
O mérito de que o juiz corregedor do Tribunal Regional Eleitoral (TRE-BA), Josevando Andrade, aparecer no vídeo, gravado em 2010, de acordo com Cláudia, mesmo ano em que ela foi acusada de compra de votos no município de Buerarema – processo relatado por Andrade que terminou com a deputada inocentada – não será analisado aqui. Essa parte também fica para outrem.
A ideia desse texto é descontruir o argumento adotado por Otto Alencar, nas aspas que abrem o post, para presumir a inocência da fala da deputada de desvio de recursos. Não há dúvidas de que foi uma brincadeira. A pinguela em que passavam Cláudia, o marido Robério Oliveira, prefeito de Eunápolis pelo PRTB, Josevando Andrade e amigos, num descontraído passeio na praia, não custaria, nem nos maiores delírios, mais do que míseros milhares – “nem R$ 10 mil”, segundo o vice governador. Porém, o que uma descrição detalhada sobre o trato da pessoa no ambiente familiar garante que não haja quaisquer desvio de conduta?
E isso não é um ataque a Cláudia Oliveira. Não é essa a intenção. Entretanto, existem diversos exemplos tácitos de que nem sempre aquele que se mostra, é aquele que se é. Vejam momentos recentes na imprensa brasileira. Pais assassinariam filhos, como o caso Isabela Nardoni? Jogadores famosos seriam suspeitos de assassinar e jogar os restos mortais de uma ex-namorada para cães? Ou uma mulher seria capaz de fatiar o marido após atirar a sangue frio, como o casal Yoki?
São extremos, diga-se de passagem. Mas não deixam de ser exemplos de que, quase sempre, as aparências dizem quase nada. E utilizar o argumento de como uma pessoa se relaciona com familiares para dimensionar que a mesma pessoa é incapaz de cometer qualquer desvio de conduta é válido? É, parece que Otto Alencar acertou em defender a correligionária. Ela estava apenas brincando. Mas daí a defendê-las com o argumento por ele utilizado é só controverter ainda mais o controverso mundo da política. Afinal, política é política, público é público e privado é privado. Ou não?
Fê, imagino que para uma pessoa pública, essa barreira do “status” privado não existe. Ela está a serviço do Estado, e tem de se portar como tal. Se em tom de brincadeira ela fez um comentário impertinente, agüente o peso de sua fala. Como diria o saudoso ditado, O Silêncio nunca em trairá. rs