Bonfim: o sagrado, o profano e o político
Na manhã desta quinta (12), milhares de baianos foram às ruas da Cidade Baixa, em Salvador, para o cortejo religioso entre a igreja de Nossa Senhora da Conceição da Praia, no Comércio, até a Colina Sagrada, onde fica a igreja do Senhor do Bonfim. A tradicional festa católica – com muitos traços do sincretismo com o candomblé – há muito tempo deixou de ser exclusivamente religiosa, passando a ser também mais um momento profano para que moradores e turistas busquem as bênçãos do Bonfim e curtam a “baianidade”. A estreia do Foca como repórter nas festividades alertou para outro viés – muito explorado pela imprensa, mas sem a reflexão devida: o lado político do percurso.
É certo que, em anos eleitorais, sejam eles de candidaturas majoritárias ou municipais, os políticos se reproduzem por brotamento. Aparecem de todos os cantos de Salvador e da Bahia para, mesmo com perfis evangélicos/ neopentecostais, pedir proteção ao Senhor do Bonfim. Enquanto passava nos arredores dos blocos partidários, diversas pessoas manifestavam suas opiniões sobre esse viés. “Tem mais político que qualquer outra coisa”, afirmou uma jovem. Até mesmo um dos políticos, Geddel Vieira Lima, reproduziu sua incredulidade sobre a participação popular. “Nunca vi um ano tão vazio quanto esse”, comentou.
Por determinação da empresa, o Foca não ficou responsável por acompanhar o PT, que seguiu na frente com o governador até a Colina Sagrada, mas conseguiu observar algumas nuances. Além das figuras conhecidas do cenário político mostrarem sua “bainidade”, o Bonfim serve para o surgimento de ilustres desconhecidos como o “vereador da Cidade Baixa”, que entregava calendários em meio ao povo – e de tão marcante teve o nome facilmente esquecido.
Para conhecidos ou desconhecidos, o Bonfim é um termômetro de popularidade. O que não significa muita coisa nas urnas. O PP da prefeitura levava dois Jorges Amados – o boneco e o neto do escritor – e dois leões – o boneco e o João Leão [secretário da Casa Civil]. No caminho, os bonecos ainda eram mais conhecidos que os outros dois. Sob a voz de Caetano Veloso, o Leãozinho acenava, abraçava o povo e ainda assim passava desapercebido entre os pepistas.
O contrário, entretanto, não se pode falar do clã Vieira Lima, com Lúcio e Geddel, sempre muito cotados pelo povo para abraços, apertos de mão e fotos – o pré-candidato Mário Kertész não apareceu por “coerência de discurso”. Pode-se falar muito menos de ACM Neto, outro bastante assediado pela população. O motorista do táxi que pegamos para a redação disse que Neto não seria um líder ainda. Tive que discordar quando ele falou sobre popularidade. O demista e os pemedebistas estavam bastante cotados pelo povo – que podem ou não resultar em votos.
Até mesmo os comunistas, mais tímidos nos meios de comunicação e nos mandatos da Bahia, eram muito requisitados pelo povo. Entre abraços e apertos de mão, a pré-candidata do PCdoB, Alice Portugal, não tem do que reclamar de receptividade. Estava tão bem na fita quanto PMDB e DEM.
O PSDB, de Antônio Imbassahy, estava tão apagado quanto a presença dele – está nos EUA, resolvendo “problemas particulares inadiáveis”. O Foca não chegou a avistar partidários do PSOL ou PSTU devidamente trajados com insígnias – falta de recurso talvez. A sensação, porém, foi os verdinhos do PV. “Não compre – plante – legalize já”, foi talvez a placa mais polêmica do cortejo. A polícia, bastante presente, olhava de canto de olho para a folha de Cannabis – em vão. Enquanto todos os outros partidos traziam bandinhas marciais com machas de carnaval, os verdes ouviam Guns N’ Roses. O mais engraçado do PV foi o primeiro momento em que eles tentaram abrir o bandeirão com a logomarca da legenda. Eram metros demais para simpatizantes de menos. Tanto que ela finalmente conseguiu ser aberta já na área sem prédios. As pessoas queriam se esconder do sol e usaram o longo TNT verde como “proteção”.
Ao que parece, entretanto, é que a população ainda que esvaziada no cortejo repetiu mais de uma vez. “Tudo política misturado com festa. Meu Deus do céu”, comentou uma popular. Quem será que o Senhor do Bonfim vai abençoar em 2012?
Em tempo, enquanto pré-candidatos, candidatos e eternos candidatos se esforçavam para chamar atenção do povo, alguns parlamentares da Assembleia Legislativa, que só voltam a eleições em 2014 se divertiam como populares: com latinha de cerveja na mão, boas risadas e distância de abraços e apertos de mão.
Fotos: Manu Dias (Secom)/ Valter Pontes/ Max Haack (Bahia Notícias)