Choveu na Primavera do Verão baiano
De acordo com a Polícia Militar, cerca de 500 pessoas participaram neste sábado (14) da mobilização nascida nas redes sociais e batizada de “Desocupa Salvador”, contra a concessão de uso da praça de Ondina a Premium Produções, responsável pelo Camarote Salvador. O movimento ganhou força no dia anterior, quando a juíza da 7ª Vara da Fazenda Pública, Lisbete Teixeira Cézar Santos, proibiu a realização do encontro e imputou à jornalista Nadja Vladi a responsabilidade pela coordenação do #Desocupa. Parte dos participantes sugeriam aos amigos que a liminar judicial apenas aumentou o interesse em participar.
Veja mais: Justiça proíbe manifestação em Ondina
A cobertura do Foca ficou restrita ao twitter, porém, passadas algumas horas da maior mobilização em Salvador utilizando redes sociais, são necessárias reflexões sobre pontos específicos do #Desocupa.
Tamanho
Durante a mobilização, os números foram supervalorizados por alguns dos envolvidos. “Pode vir, já são quase mil pessoas aqui”, relatava empolgado ao telefone um dos muitos senhores que participavam. As estimativas da Polícia Militar, que fizeram um cordão de isolamento na pista de Ondina, sugerem que cerca de 500 pessoas chegaram de fato a entoar os gritos de “Desocupa”. O número, entretanto, é pífio, se considerado o tamanho da população de Salvador, com cerca de 3 milhões de habitantes.
A comparação com outras mobilizações nascidas em redes sociais é inevitável nesse tipo de situação. Por isso, mesmo que tenha sido um sucesso para os hábitos soteropolitanos – e mesmo que o número de mil pessoas fosse confirmado -, o resultado do #Desocupa é vergonhoso. Enquanto alguns milhares de cidadãos clamaram por melhores condições de vida e cidadania no Egito, Líbia, Estados Unidos (etc)
– comparação desigual, mas difícil de não fazer –, em Salvador, o uso do patrimônio público pelo setor privado não mereceu destaque na agenda de mais de 99,9% da população. “É injusto concorrer com o Trivela [festa com Asa de Águia e Cláudia Leitte que acontecia no mesmo horário da mobilização]”, comentou uma jovem que tentava agitar o pequeno número de pessoas presentes.
Os participantes, entretanto, ressaltaram, em diversos momentos, que essa mobilização foi a maior de Salvador desde o advento das mídias sociais. Não quero imaginar o quão pífia foram as outras.
Diversidade
Não havia um padrão entre os participantes. Eram jovens, adultos e idosos. Estudantes, intelectuais e artistas. A massa era tão disforme que figuras conhecidas como o ex-reitor da Ufba, Naomar Almeida, e as vereadoras Vânia Galvão e Olívia Santana passaram completamente despercebidas da maioria dos presentes. As únicas características que parecia ser compartilhadas eram o uso de redes sociais – inclusive em dispositivos móveis – e o traço de intelectual nas roupas e nas posturas. “Somos um movimento artístico e pacífico. Não vamos dar motivos para que a polícia tenha que agir”, clamou uma voz ao microfone.
Outra característica importante foi a tentativa de não misturar o movimento com partidarismo. Num dado momento, alguém tentou usar o microfone para fazê-lo e foi rechaçado pela maioria. Ponto para os manifestantes. Pena que o perfil intelectual, em alguns momentos, não serviam muito. Os discursos “cabeça” não eram ouvidos e não empolgavam – o som vinha de um carrinho de café que, no início da mobilização funcionou, mas depois que o número de pessoas aumentou, sumiu. “Os policial (sic) estão aqui nos ajudando, então vamo (sic) colaborá (sic)”, falaram ao microfone. Podia imputar a responsabilidade a um popular incorporado ao movimento, mas veio de um desses “intelectuais”. É bom aprender português…
Caos organizado
Pouco antes das 18h, horário agendado para o início do #Desocupa, uma viatura da Polícia Militar deu algumas voltas na área – ainda com pouco menos de 30 pessoas – e parou próximo ao local onde começava a concentração. O policial perguntou a diversos participantes quem era o líder do movimento. A resposta foi a mesma: “Não há um líder. Somos todos líderes”.
A jornalista Nadja Vladi, citada na liminar, não apareceu. Ainda que aparecesse, não seria considerada líder. Os participantes do #Desocupa se vangloriavam pela ausência de uma liderança, o que permitia liberdade de expressão total. O que era para ser uma virtude do movimento, entretanto, mostrou-se também uma das falhas.
“Afinal, o que eles estão querendo?”, questionou um corredor que usa o espaço da orla para prática de atividade física. “Parece algo sobre uso de bicicletas, veja lá o cartaz”, respondeu o amigo dele. Dispersos, apareceram diversos cartazes, que não identificavam as reivindicações. Para parte da população que passava, o movimento parecia um grupo de pessoas falando sobre nada e discutindo sexo dos anjos. Sem uma figura central, que pudesse coordenar a mobilização, não houve um norte ou, ao menos, algo que desse a identidade que o movimento necessitaria. Ainda assim, a mobilização aconteceu sem maiores transtornos, apenas com o trânsito um pouco lento na área – não provocou engarrafamentos.
E agora?
Depois de quase duas horas, atravessando de um lado para outro da orla, os manifestantes começaram a se dispersar – algo que não aconteceu nem durante a chuva. A pergunta que ficou no ar, após o período de gritos, foi: “e agora?”. Não houve um fim. Assim como não houve um começo. Para um movimento artístico, como foi divulgado, era esperada alguma intervenção no final. Que fosse um grafite no papel metro que ficasse pendurado nos tapumes da montagem do camarote. Não. Não houve um marco para que outros vissem o que aconteceu. Apenas quem estava lá pode acompanhar. Quem não estava, pode ler ou assistir nas redes sociais. Mas será que há algo a comemorar?
Tomara que o #Desocupa não termine como carnaval, já que alguns turistas acreditaram que o movimento era apenas mais uma representação da folclórica “baianidade.
Veja um dos muitos vídeos publicado no YouTube com imagens do movimento:
Infelizmente nao pude participar, estou um “pouquinho” longe mas hoje tem milhões de câmaras, nao precisa da minha..mas me chamou a atenção nao ter visto a jornalista AGREDIDA pela juíza do sistema na manifestação. Não para fazer dela uma líder, apenas para fortalecer a rejeição à medida judicial in situ. Como mais um elemento de desobediência civil. Essas 200 pessoas podiam tranquilamente impedir ao braço policial do poder judiciário, se aparecesse, exercer de fato sua corrupção institucional/privatizadora. Nao estou querendo gerar com isto o que poderia ter sido um ato irresponsável de incitar a agressão policial e a conseguinte resposta popular, bem, tal vez nem tão popular pelo que vejo nas imagens mas pelo menos dos que estavam ali..por isso digo tem que incentivar o povão a participar destas manifestações apesar de nao usufruir dos equipamentos de lazer dos bairros nobres mas eles aguentam melhor a barra….Pergunto então, se muita gente, além da que já iria mesmo foi indignada pela desastrada decisão da juíza/empresa porque o pivote da tentativa de proibir a voz da indignação nao vai…é jornalista de um importante médio informativo local, teria, tem uma imensa retaguarda corporativa e popular… acaso está presa?